O acordo entre os ex-presidentes Lula e Hugo Chávez deixou o Brasil com
a missão de garantir, sozinho, investimentos de quase US$ 20 bilhões
Lisandra Paraguassu e Andreza Matais e Fabio Fabrini, do Estadão
Brasília - Documentos
inéditos da Petrobras aos quais o Estado teve
acesso mostram que a empresa brasileira abriu mão de penalidades que exigiriam
da Venezuela o pagamento de uma dívida
feita pelo Brasil para o projeto e o começo das obras na refinaria Abreu Lima,
em Pernambuco.
O acordo "de
camaradas", segundo fontes da estatal, feito entre o ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva e o ex-presidente da Venezuela Hugo Chávez deixou o Brasil
com a missão de garantir, sozinho, investimentos de quase US$ 20 bilhões.
O acordo previa que a
Petrobras teria 60% da Abreu e Lima e a Petróleos de Venezuela SA (PDVSA), 40%.
Os aportes de recursos seriam feitos aos poucos e, caso a Venezuela não pagasse
a sua parte, a Petrobras poderia fazer o investimento e cobrar a dívida com
juros, ou receber em ações da empresa venezuelana, a preços de mercado.
Essas penalidades, no
entanto, só valeriam depois de assinado o contrato definitivo, de acionistas.
Elas não chegaram a entrar em vigor, já que o contrato não foi assinado.
Os documentos obtidos
pelo Estado mostram que a sociedade entre a Petrobras e PDVSA para construção
da refinaria nunca foi assinada. Existe hoje apenas um "contrato de
associação", um documento provisório, que apenas prevê, no caso de
formalização futura da sociedade, sanções pelo "calote" venezuelano.
Desde 2005, quando esse termo de
compromisso foi assinado pelos dois governos, até o ano passado, a Petrobras
tentou receber o dinheiro devido pela PDVSA - sem sucesso. Em outubro do ano
passado, quando o investimento na refinaria já chegava aos U$ 18 bilhões, a
estatal brasileira desistiu.
Os venezuelanos não
negam a dívida. No item 7 do "contrato de associação" a PDVSA admite
sua condição de devedora (ver ao lado).
Antes desse
documento, ao tratar do fechamento da operação, uma das condições era o
depósito, pelas duas empresas, dos recursos equivalentes à sua participação
acionária em uma conta no Banco do Brasil - o que a o governo da Venezuela
nunca fez.
Em outro documento
obtido pelo Estado, a Petrobras afirma que estariam previstas penalidades para
o "descumprimento de dispositivos contratuais". Como nos outros
casos, essa previsão não levou a nada, porque as penalidades só seriam válidas
quando a estatal venezuelana se tornasse sócia da Abreu e Lima - e isso não
ocorreu.
Chávez e Lula
A ideia de construir
a refinaria partiu de Hugo Chávez, em 2005. A Venezuela precisava de
infraestrutura para refinar seu petróleo e distribuí-lo na América do Sul, mas
não tinha recursos para bancar tudo sozinha.
Lula decidiu bancar a
ideia. Mas Caracas nunca apresentou nem os recursos nem as garantias para obter
um empréstimo e quitar a dívida com a Petrobrás.
Em dezembro de 2011,
em sua primeira visita oficial a Caracas, a presidente Dilma Rousseff tratou o
assunto diretamente com Chávez, que prometeu, mais uma vez, uma solução.
Nessa visita, o
presidente da PDVSA, Rafael Ramírez, chegou a anunciar que "havia cumprido
seus compromissos" com a empresa e entregue uma "mala de dinheiro em
espécie" e negociado uma linha de crédito do Banco de Desenvolvimento da China.
Esses recursos nunca se materializaram.
O projeto inicial,
que era de US$ 2,5 bilhões, já chegava, em outubro do ano passado, aos US$ 18
bilhões, quando a Petrobras apresentou ao seu Conselho de Administração a
proposta de assumir integralmente a refinaria. A estimativa é que o custo total
fique em torno de US$ 20 bilhões.
Para justificar os
novos valores, a empresa cita ajustes cambiais e de contratos, gastos com
adequação ambiental e o fato de ter ampliado a capacidade de produção de 200
mil para 230 mil barris por dia.
Os novos itens e a
ampliação da produção explicariam o custo oito vezes maior que o inicial.
Procurada pelo jornal O Estado de S. Paulo, para falar sobre o
"calote" da Venezuela, a Petrobras informou que nada comentará. As
informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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